Dizem os militares que navegam no "Creoula" que este veleiro de treino de mar "tem uma alma, um espírito".
Parte dessa "alma" são os militares da Marinha Nuno Pinto e António Silva, padeiro e chefe de cozinha do navio, respetivamente. Sem eles, o "espírito" do Creoula - que também se faz da corrida noturna ao "choripan" e vive vaidoso dos menus elogiados pela realeza - não seria o mesmo...
Pinto faz o famoso pão com chouriço
O doce cheiro a pão com chouriço que ao final de cada noite sai da cozinha do Creoula não engana: é Nuno Pinto - ou Pinto, como é conhecido a bordo - quem lá está, a preparar os pães com chouriço que hão-de reconfortar os estômagos dos que entram e saem de serviço - militares e instruendos - ao bater das 12 badaladas.
É assim desde Abril de 2011, quando este 1º marinheiro TFP (Técnico Formado em Panificação) passou a integrar a guarnição do "Creoula", e é assim desde que todos se recordam.
"Quando aqui cheguei, o comandante disse-me logo que neste navio é tradição fazer-se todos os dias o pão com chouriço, o que noutros navios não é costume", recorda o militar de 31 anos, natural de Vila Real. "Isto é um mimo que se dá ao pessoal da guarnição", diz Pinto, que apanhou o jeito aos famosos "choripan" e desde então nunca mais parou de fazê-los. Saem-lhe das mãos todos os dias pela meia-noite, num ritual que só os temporais são capazes de quebrar, e antes da hora já se vai juntando gente à porta da cozinha a querer saber se o pão está para sair. "As pessoas adoram o pão com chouriço", orgulha-se o padeiro do Creoula.
Por noite faz oito, que são fatiados. "Devia dar três fatias para cada pessoa, mas há quem coma 10. Pedem sempre mais, e acho que mesmo que fizesse 50 [pães] não chegava", brinca o marinheiro Pinto, que ingressou na Marinha aos 19 anos, "logo como padeiro". Além de fabricar o pão que se come no "Creoula", o militar ainda faz doces (são servidos à quinta-feira e ao domingo, por tradição), como "as tortas de mel, de que o senhor comandante gosta muito". Entre as especialidades contam-se ainda a sericaia, tarte de requeijão e cheesecake, diz.
Até um rei elogiou a comida do chefe Silva
O cabo António Silva chegou ao Creoula há meio ano, mas já soma inúmeros elogios aos menus que todos os dias engendra na pequena cozinha do antigo bacalhoeiro. E foi um prato de strogonoff de peru com molho de manga, precedido de uma entrada de cocktail de camarão - tudo confecionado no veleiro -, que lhe valeu ainda um rasgado elogio do rei da Suécia, soube o JN.
O segredo para tanto sucesso? O chefe Silva sorri. Tem a resposta na ponta da língua: "É fazer aquilo de que gostamos e é o espírito de equipa. Gosto muito daquilo que faço; é mesmo amor à camisola", confessa o cabo TFH (Técnico Formado em Hotelaria), de 37 anos.
Tem os olhos da cor do mar, de um azul que parece ficar mais intenso quando nos conta que o reconhecimento do trabalho diário é ainda uma recompensa pelo esforço que faz em adquirir novos conhecimentos na área da culinária. "Além do curso da Marinha, vamos procurando atualizar-nos. As pessoas comem melhor porque vamos à procura de novos sabores, cheiros e misturas de comidas. E isso é por gosto pessoal", diz o militar, que divide a cozinha com mais dois marinheiros.
"A bordo, a alimentação é muito importante. De três em três horas, o pessoal está abonado. E têm de estar sempre bem alimentados, porque se se comer mal anda-se maldisposto", explica o militar, que realça a importância de haver variedade nas ementas. E com instruendos vegetarianos a bordo, o desafio é ainda maior. "Temos feito saladas e pizzas vegetarianas, e têm sido elogiadas", destaca.
Mas o elogio mais importante vem sempre do comandante do Creoula, o capitão-de-fragata Cruz Martins. "Quando chega dele, é a cereja no topo do bolo", confessa o cabo Silva, que entrou para a Marinha em 1997 e também desempenha a função de socorrista.